sábado, 11 de maio de 2013

Mas o que seria o SUS? Quais suas diretrizes e princípios gerais?


A concepção de um sistema único de saúde (SUS) e sua institucionalização por meio da Constituição foram um dos maiores avanços na luta pela construção de um país mais justo e menos desigual.

SUS - Um dos maiores avanços na luta pela construção de um país mais justo e menos desigual
Para se iniciar a discussão é possível partir de uma definição conceitual dada por Cipriano Vasconcelos e Dário Pasche (2006), os quais apontam que: “O Sistema Único de Saúde (SUS) é o arranjo organizacional do Estado brasileiro que dá suporte à efetivação da política de saúde no Brasil, e traduz em ação os princípios e diretrizes desta política. Compreende um conjunto organizado e articulado de serviços e ações de saúde, e aglutina o conjunto das organizações públicas de saúde existentes nos âmbitos municipal, estadual e nacional, e ainda os serviços privados de saúde que o integram funcionalmente para a prestação de serviços aos usuários do sistema, de forma complementar, quando contratados ou conveniados para tal fim”. (VASCONCELOS e PASCHE, 2006, p. 531).       
Nasceu na década de oitenta, fruto da reivindicação social da sociedade civil através de movimentos pela reforma sanitária, sendo institucionalizado quando da promulgação da Constituição Nacional de 1988. É possível dizer que o SUS tem como objetivo integrar e coordenar as ações de saúde nas três esferas do governo. O artigo 4° da Lei 8.080/90 afirma que: O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde – SUS. Em sua concepção, é importante apontar que o SUS são se trata de um sistema de serviços assistencialistas, mas que visa “articular e coordenar ações promocionais e de prevenção, como as de cura e reabilitação.” (Ibidem, p. 532).
O SUS traria uma nova concepção de saúde agora ampliada, pois passaria a considerar também outros fatores que, direta ou indiretamente, estariam associados ao se pensar a saúde e qualidade de vida como aspectos econômicos, sociais, culturais e biotecnológicos (estes aspectos serão tratados mais pontualmente no tópico a seguir). Somado a isso, estaria também uma visão integrada das ações e dos serviços de saúde. Logo, o caráter inovador estaria na criação de condições para a superação de uma visão de saúde pública que se concentrava na doença.
São 3 os princípios doutrinários que conferem legitimidade ao SUS: a universalidade, a integralidade e a equidade. A universalidade está ligada à garantia do direito à saúde por todos os brasileiros, sem acepção ou discriminação, de acesso aos serviços de saúde oferecidos pelo SUS. O significado deste princípio é extremamente relevante para a consolidação da democracia, pois, partir de então, não apenas as pessoas com carteira assinada (ligadas à previdência) poderiam contar com tais serviços, mas toda a população. Outro princípio fundamental é integralidade. Tal conceito parte da ideia de que existem várias dimensões que são integradas envolvendo a saúde dos indivíduos e das coletividades. Assim, o SUS procura ter ações contínuas no sentido da promoção, da proteção, da cura e da reabilitação. Como apontam Vasconcelos e Pasche (2006, p. 535), “esse princípio orientou a expansão e qualificação das ações e serviços do SUS que ofertam desde um elenco ampliado de imunizações até os serviços de reabilitação física e mental, além das ações de promoção da saúde de caráter nacional intersetorial.” Da mesma forma, a equidade “como princípio complementar ao da igualdade significa tratar as diferenças em busca da igualdade” (ELIAS, 2008, P. 14). Assim, este princípio veio ao encontro da questão do acesso aos serviços, acesso muitas vezes prejudicado por conta da desigualdade social entre os indivíduos. Neste sentido, fala-se em prioridade no acesso às ações e serviços de saúde por grupos sociais considerados mais vulneráveis do ponto de vista socioeconômico. Na obra A saúde como direito e como serviço, Amélia Cohn (1991, p. 25) afirma que: “Constituir, portanto, a saúde como ‘um direito de todos e dever do Estado’ implica enfrentar questões tais como a de a população buscar a utilização dos serviços públicos de saúde tendo por referência a sua proximidade, enquanto para os serviços privados a referência principal consiste em ‘ter direito’. Da mesma forma, e exatamente porque essas questões remetem à tradição brasileira de direitos sociais vinculados a um contrato compulsório de caráter contributivo, contrapostos a medidas assistencialistas aos carentes, a equidade na universalização do direito à saúde está estreitamente vinculada às mudanças das políticas de saúde no interior de um processo de alteração da relação do Estado com a sociedade, o que vale dizer, da alteração do sistema de poder no país.”
Para além destes três princípios básicos para se pensar o SUS, é também relevante apontar outro aspecto como o direito à informação, requisito importante - do ponto de vista democrático - para vida do cidadão usuário do sistema. É fundamental que as informações acerca da saúde individual e coletiva sejam divulgadas pelos profissionais da saúde, os quais são assim responsáveis pela “viabilização deste direito” (VASCONCELOS e PASCHE, 2006, p. 536).
Além dos princípios, do ponto de vista do funcionamento do SUS, deve-se considerar suas diretrizes organizativas, as quais buscam garantir um melhor funcionamento do sistema, dentre as quais estão: a descentralização com comando único, a regionalização e hierarquização dos serviços e participação comunitária.
O processo de descentralização tinha como objetivo alcançar a municipalização da gestão dos serviços, o que certamente representou a quebra de um paradigma. Assim, para cada esfera de poder regional (União, Estado e Município) haveria um responsável local, mas articulado com as outras esferas. Ao se falar da descentralização faz-se necessário pensar na regionalização. Como apontam Vasconcelos e Pasche (2006), o objetivo da regionalização é ajudar na melhor e mais racional distribuição dos recursos entre as regiões, seguindo a distribuição da população pelo território nacional. Já com relação à hierarquização, o que se almeja é ordenar o sistema por “níveis de atenção e estabelecer fluxos assistenciais entre os serviços de modo que regule o acesso aos mais especializados, considerando que os serviços básicos de saúde são os que ofertam o contato com a população e são os de uso mais frequente”. (Ibidem, p. 536).
Outra diretriz muito importante ao SUS e que, certamente, está ligada também a uma mesma raiz democrática pertinente ao sistema é a participação comunitária e a criação dos conselhos. A participação comunitária foi assegurada por lei (8.142/1990), o que valoriza a ideia de democracia participativa. Neste mesmo sentido da valorização do SUS como um patrimônio e responsabilidade de todos, foram criados em 2006 três pactos: o Pacto pela vida, o Pacto em defesa do SUS e o Pacto de Gestão do SUS. Do ponto de vista da concepção das políticas para saúde, todos devem ser considerados.
Por fim, há também uma preocupação com a questão da Integração. “A integração de recursos, de meios e de pessoal na gestão do sistema é preconizada nas leis e normas como condição básica para assegurar eficácia e eficiência ao sistema” (Ibidem, p. 537). Da mesma forma, para a além da compreensão dos princípios e das diretrizes organizativas do SUS, é importante destacar a questão da racionalização do sistema com vistas ao melhor desempenho e atendimento de seus objetivos.
Logo, o que se pode concluir é que a concepção de um sistema único de saúde e sua institucionalização por meio da Constituição foram um dos maiores avanços na luta pela construção de um país mais justo e menos desigual. Se ainda existem problemas no atendimento público da saúde – e não são poucos, é inegável o fato de que, a despeito disso, o SUS contribuiu para o fortalecimento da cidadania nacional, uma vez que o direito ao atendimento à saúde é um importantíssimo direito social.

Paulo Silvino Ribeiro
Colaborador Brasil Escola- Bacharel em Ciências Sociais pela UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas. Mestre em Sociologia pela UNESP - Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" Doutorando em Sociologia pela UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas